O Conto – Dir: Jennifer Fox |
Nos últimos muito tem se falado sobre a mulher na sociedade.
O empoderamento feminino está cada vez maior e especialmente nas redes sociais.
Junte isso a uma atual Hollywood infestada de denúncias de assédio sexual com
atores tendo suas carreiras praticamente encerradas. As mulheres estão
devidamente conquistando seu espaço e, mais importante, sendo ouvidas e
manifestando os absurdos com que lidam todos os dias. Naturalmente isso viria a
inspirar temas em filmes e O Conto lida com isso de forma impecável.
A diretora Jennifer Fox faz de seu longa praticamente um
manifesto sobre seu passado. A história é tão verídica quanto chocante. Jennifer
já adulta descobre uma redação escrita por ela mesma aos 13 anos idade da época
da escola me que os alunos foram designados a escrever uma história que tivesse
acontecido com eles. Ela passa então relembrar os eventos perturbadores de sua
infância que até então eram memórias reprimidas. Sendo assim, o longa alterna
entre flashbacks da infância de Jennifer e sua vida adulta lidando com o
retorno de suas memórias perturbadoras.
O que faz O Conto ser um filme tão incrível é não apenas a
forma como aborda uma tema tão delicado como abuso infantil, mas também como a
própria Jennifer lida com seu passado. O filme é um exemplo perfeito de como
fazer um drama sólido, com um roteiro que flui sem pesar demais e uma perfeita harmonia
dos elementos da mis-en-scene. O elenco também é digno de aplausos. Laura Dern é
brilhante em sua versão de Jennifer adulta, assim como a pequena Isabelle Nélisse
interpretando a protagonista aos 13 anos de idade. Jason Ritter também dá conta
com maestria de seu personagem com emoções complicadas e uma profundidade psicológica
que o ator transmite de forma simples.
Outro objetivo claro e bem sucedido do filme é questionar quem de fato é a
vítima numa situação de abuso infantil. Jennifer é uma mulher implacável em
lidar com seu passado sozinha, sem ajuda de ninguém, afinal, só ela sabe pelo
que ela passou e o que sentia e pensava a respeito de seu abusador. Ela não se
permite sofrer por algo que aconteceu há tantos anos atrás e ela nem mesmo lembrava.
E ainda assim, durante os flashbacks entendemos claramente os porquês de uma
Jennifer de 13 anos se permitir um relacionamento indiscutivelmente errado e
inaceitável. É como se as duas Jennifers (adulta e criança) entrassem um conflito
psicológico e o espectador acompanha isso. Jennifer entende porque fez o que
fez quando criança e precisa lidar com isso agora adulta.
Após 2 horas de filme, é impossível não se sentir tocado, impactado
pela história. Isso também porque as cenas de sexo envolvendo a pequena Jennifer
são chocantes, de tirar o fôlego, mas ao mesmo tempo digerível e discreta. Jennifer
Fox soube dirigir cenas extremamente delicadas com habilidade incontestável
talvez até mesmo por ser sua própria história. Jennifer Fox deixa em seu longa
uma mensagem clara e universal para todas as mulheres cheia de positividade e
encorajamento à mais mulheres contarem suas histórias e a importância que isso
pode ter um mundo em que a mulher ainda é lamentavelmente vista como objeto
sexual.
É aquele filme que faz com que você reflita inúmeros
aspectos sobre o tema independente de ser homem e mulher. Não tem como assistir
O Conto e não ser marcado de alguma forma por ele. E nisso, Jennifer Fox foi
simplesmente genial. O Conto é o tipo de filme que merece ser visto, aliás, DEVE
ser visto, discutido, debatido e devidamente premiado. Na singela opinião do
cinéfilo que vos fala, já daria para apostar algumas fichas no próximo Oscar.
Nota - 5 estrelas