Resenha do filme “A Forma da Água”


Depois de inaugurar nossa coluna de Games, agora trouxemos para vocês nosso espaço reservado ao cinema que terá (sempre que possível) novidades, resenha dos filmes lançados e afins. Na última Quinta-feira (01), o colaborador Pedro Mauro assistiu ao A Forma da Água e nos contou sobre ele.


Resenha do filme “A Forma da Água” – Dir: Gillermo Del Toro – Por Pedro Mauro

Dirigido pelo impecável Guillermo Del Toro e com 13 indicações ao Oscar 2018, “A Forma da Água” é uma belíssima fábula de amor ao melhor estilo do diretor, diferente de tudo que já se viu em muito tempo. Logo de cara, somos introduzidos à história por um cenário quase lúdico e um narrador falando sobre príncipes e princesas e, é claro, um “monstro” que tentou destruir tudo. Ambientado nos anos 60 em Baltimore, quando a Guerra Fria estava fervendo e a corrida espacial era o grande símbolo de poder e tecnologia. Conhecemos a afinada rotina de Elisa Esposito, vivida magistralmente por Sally Hawkins, uma faxineira muda que trabalha em um laboratório do governo dos EUA. Doce, tímida, triste, mas apaixonada e, acima de tudo, solitária, ela descobre uma criatura, uma espécie de homem-anfíbio do qual logo de cara gostamos e podemos ver a genialidade de Del Toro em criar “monstros” que parecem absolutamente reais.

Nesse ínterim, conhecemos também Zelda, fiel amiga de Elisa, que literalmente fala por ela, além de ser interpretada pela querida Octavia Spencer, que garante alguns dos momentos mais cômicos do filme. Temos também Richard Jenkins como Giles, vizinho de Elisa, e praticamente sua única família também. O elenco ainda conta com Michael Stuhlbarg como o Dr. Hoffstetler e o brilhante Michael Shannon como o odioso, implacável e intimidante Strickland, responsável pelo contraponto do filme. Vemos seu personagem ruindo aos poucos física e psicologicamente, até que percebemos o quão imprevisível e cruel ele pode ser.


O filme merece cada uma das 13 indicações pois além de ser uma obra de arte visual, é também um filme sem furos de roteiro, sem clichês e acima de tudo muito humano. Tratando-se de uma fábula, podemos até fazer metáforas e analogias com grupos de minorias que sofrem todo tipo de preconceito e injustiça por serem diferentes. Porém mais que isso, o diretor tem uma habilidade fantástica em nos dar informações importantes com muito pouco. Vemos a forte ligação de amizade entre Elisa e Giles na cena em que sapateiam juntos, até lembrando o favorito do Oscar anterior, “La La Land.”


Mas também somos presenteados com cenas tipicamente poéticas, líricas e talvez até surreais quando Elisa e a tal criatura fazem do banheiro um aquário gigante. O filme também conta com uma fotografia que reforça ainda mais a magia da história. Dan Lausten nos coloca num ambiente esverdeado e azulado para nos manter no clima subaquático da história. E como poderia se espera de um filme desses, a trilha sonora também é também única. Indo do tema de abertura do filme composto pelo francês Alexandre Desplat, que é uma das coisas mais belas a ser ouvidas, até Carmem Miranda, o filme impressiona a cada cena, a cada sequência.


E se tem alguém que também merece um grande mérito, é Doug Jones, responsável por dar vida ao homem-anfíbio. Doug Jones está para Guillermo Del Toro, assim como Andy Serkis está para Peter Jackson e a captura de movimentos. Doug Jones foi quem deu vida ao Fauno, Abe Sapien em “Hellboy” e o Surfista Prateado em “Quarteto Fantástico” e diversos outros personagens não-humanos apenas com figurinos e maquiagem. Com todo esse histórico, a maioria em filmes do próprio Del Toro, seria fácil adivinhar que ele nos entregaria algo tão exclusivo quanto seu personagem, que, assim como Elisa, vive no silêncio e se comunica por sinais e nos da momentos únicos na história do cinema. Mesmo porque ele é o reflexo dela. Chega a ser quase um conto de fadas que usa arquétipos clássicos, sem reprimi-los ou julga-los. Também é comparável com A Bela e a Fera, mas a bela não é casta, a fera não precisa de cura e o vilão não se limita a destruição desse amor. Mais que isso, a maldade de Strickland é consequência de um homem estressado, obcecado pelo sucesso, poder e controle, e surdo a tudo a seu redor.


Mais do que declarar seu amor por monstros, Del Toro troca clichês abstratos por empatia para descobrir como contar uma história de clima belo, tradicional e até acessível, mas também profunda e muito original. Nada é aleatório. Guillermo del Toro usa todos os seus recursos do cinema para criar um universo mágico, cheio de alegorias, que talvez fale por aqueles que sintam que não se encaixam. Acima de tudo, A Forma da Água é uma história de amor, como só del Toro poderia nos contar.
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